Sabe aqueles dias que você acorda sem disposição para nada. Parece que tomou uma surra e não aguenta nem levantar da cama?
Geralmente acontece aos sábados pra mim, depois de uma sexta-feira bem aproveitada enchendo a cara com os amigos do trabalho. Bate na cama e dorme até lembrar que tem que acordar.
Sim, era um sábado daqueles... E quem disse que eu acordava? Abri apenas um olho por causa da preguiça e fixei-o no relógio da cabeceira da cama. Nossa, eram onze e meia e, então, tinha que sair da inércia. Nem sei como, mas com muito esforço consegui me despedir da minha amiga cama e aproveitando à disposição repentina me coloquei debaixo do chuveiro gelado. Ai como dói!
É, melhorei um pouquinho, mas não justificava ter que ir a cozinha uma hora daquelas. É meus amigos, para aumentar meu pesadelo, em alguns sábados sou o chefe de cozinha para todos aqui em casa. Esse sábado estava escalado, mas esse não ia rolar. Não ia rolar mesmo!
Peguei minha esposa e minha filha e no carro decidimos “democraticamente” qual seria o menu e onde iríamos. É claro que minha esposa tem peso dois e assim foi decretado. Peixe!
Então ajustei o GPS para Rua Visconde do Rio Branco, 55, Pontal da Areia e fomos nós.
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A imagem de São Pedro no interior do mercado. Foto: Gabriel de Paiva/19-11-2008. link |
Logo na entrada fomos recebidos por uma imagem de São Pedro, mas nem houve necessidade de pegar a chave da casa com ele, as portas já estavam abertas e já estávamos bem à vontade.
Passando por São Pedro nos deparamos com várias peixarias e uma combinação de cores que jamais imaginaria que o mar pudesse nos oferecer. O detalhe que não tinha aquele cheiro forte e enjoativo de peixe. Tudo muito limpo.
Antes que enfiasse a mão no focinho do vendedor por cantar a minha mulher. Entrei na brincadeira e agi com naturalidade. Em pouco tempo já estava Íntimo do peixeiro e não perdi a oportunidade para perguntar qual o peixe que era bom para curar ressaca.
O peixeiro passou a mão no jaleco levantou o ombro e com uma postura de doutor na mesa de operação respondeu.
Quem sou eu para duvidar. Só espero que ele aceite Unimed.
Ainda fiquei uns 15 minutos conversando com o Doctor Fish, o tempo suficiente para ele me convencer a levar 1 quilo de linguado, pois não tinha espinha. Sugeriu que eu e minha família subíssemos até o segundo andar para desfrutar dessa iguaria feita na hora.
Pois bem, subimos as escadas e sentamos a uma mesa de madeira e enquanto esperávamos nosso almoço entre uma conversa e outra comecei a viajar pela história daquele lugar.
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Antigo Mercado de Peixe São Pedro, Rua Visconde do Rio Branco, Centro, Niterói, palafitas, 1970, A/D |
Antes mesmo de ser inaugurado em 29 de junho de 1971 o Mercado de São Pedro já existia desde metade do século XIX. O novo mercado veio substituir o conjunto de barracas e palafitas que avançavam as águas da Baia de Guanabara sobre um cais flutuante na antiga Rua da Praia, hoje Visconde do Rio Branco, centro, mais ou menos onde hoje é o terminal João Goulart.
Quase todos os barraqueiros eram católicos e era comum nos anos 60 realizarem uma grande festa no mês de junho para São Pedro, padroeiro dos pescadores. E assim o santo deu o nome ao mercado.
Mas, em 1970 saiu do papel o plano de aterro da Praia Grande, concebido desde 1940 através de um decreto-lei assinado por Getúlio Vargas autorizando a prefeitura a executar um plano de urbanização e remodelação da cidade permitindo o aterro da faixa litorânea compreendida entre a Ponta da Armação (bairro da Ponta da Areia) e a Praia das Flechas, no Ingá. Então foi no governo de Raimundo Padilha que são iniciadas as obras do aterro a cargo da recente criada Companhia de Desenvolvimento e Urbanismo do Estado do Rio de Janeiro que se utilizou do desmonte do Morro de Gragoatá para fornecimento de terra para os aterros.
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Vista frontal do antigo Mercado de Peixe São Pedro, Rua Visconde do Rio Branco, Centro, Niterói, palafitas, 1970, A/D |
E assim o velho mercado de palafitas e barracas não poderia mais ficar ali e tinha que encontrar um lugar para a sobrevivência dos barraqueiros. O próprio governo do estado decidiu transferi-lo para um galpão no Ceasa, no Barreto, e por ficar muito longe do mar os barraqueiros não aceitaram a transferência.
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Corredores do Antigo Mercado de Peixe São Pedro, Rua Visconde do Rio Branco, Centro, Niterói, palafitas, 1970, A/D |
Unidos criaram a cooperativa “Comercial São Pedro” com aproximadamente 48 barraqueiros conseguiram juntar uma quantia em dinheiro para comprar um terreno nas proximidades do antigo mercado já que ali havia a colônia de pescadores responsável pelo abastecimento do mercado.
Hoje, o Mercado de São Pedro é o mais popular do estado do Rio de Janeiro e por lá circulam mais de 5 mil pessoas por semana entre donas de casa e chefes de grandes restaurantes de Niterói e até de outros Estados do país comprando o equivalente a 30 toneladas de peixes e frutos do mar. São 300 empregos diretos no mercado e é claro, hoje não mais abastecido pela colônia de pescadores local, a grande maioria vem da região dos lagos.
Interrompendo meu devaneio ouço uma voz lá no fundo.
Minha família e eu caímos para dentro do linguado acompanhado de um delicioso molho de camarão.
Realmente o doutor com formação em peixes tinha toda razão, foi um ótimo remédio. O peixe frito me deixou super bem disposto e contando as horas para semana passar bem rápido. Santo remédio!
QUE VENHAM OUTRAS SEXTAS-FEIRAS! E OUTROS SÁBADOS REGADOS DE PEIXE, É CLARO!
Texto publicado em 26 março de 2014 no Tafulhar.
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