Toda criança é apaixonada por um
parque de diversão. Eu não fui diferente, até um período da minha infância.
Foi num domingo do ano de 1985, eu
com 13 aninhos. Embora fosse uma criança desde pequeno sempre tive um biotipo
avantajado para os padrões de um menino da minha idade. Bom, vamos ser sincero,
gordinho. Tá bom, vamos ser mais sincero ainda, GORDO. Assim como eu era
apelidado entre meus amigos de infância, e era esse apelido que muitas vezes
deixava minha avó fula da vida quando um desses amiguinhos me gritava na porta
de casa para sair para brincar: -GORDO !
- ELE É GORDO PORQUE ALMOÇA E JANTA
! Gritava dona Olívia da cozinha, com a colher de pau na mão onde na maioria
das vezes estava preparando o rango para
o jantar.
Para piorar, a genética também não
ajuda. Como um legitimo descendente de alemão sempre fui grandão. Só para
constar, no jardim de infância, sabe
aquela fila indiana que nos colocam um atrás do outro com mãozinha no
ombro sempre do menor para o maior? Eu era sempre o ultimo da fila. Mas você
deve estar se perguntando o porquê dessa minha narrativa que é um bulling de
mim mesmo. Bom, vocês entenderão no decorrer do texto.
Vamos voltar naquele domingo de
1985 onde amarradão assistia o programa
Domingo no Parque do Silvio Santos. Era aquele programa que trancavam a criança
em uma cabine em formato de foguete, colocavam um fone de ouvido na pobrezinha
e ela tinha que dizer sim ou não quando acendia a luz vermelha. Enquanto isso o
Silvio fazia troca-troca dos prêmios. E era cada uma. “Você quer trocar um
carro zero quilômetro por uma caixinha de fósforo?”. Eu naquela adrenalina do
programa, fui interrompido pela minha mãe me perguntando seu gostaria ir ao
Tivoli Park. “-SIM!”, soltando um grito
como se tivesse no programa do Silvio. Talquinho no sovaco e gel no cabelo fui
eu com minha família à sensação dos anos 80.
Silvio coloca sua filha Daniela para participar do programa
O parque foi criado pelo já famoso
empresário circense, Orlando Orfei em 1972 que não economizou para trazer brinquedos de ultima geração para o terreno cedido
pelo então governador do Estado da Guanabara, Chagas Freitas. Esse terreno
ficava as margens da Lagoa Rodrigo de Freitas onde hoje se encontra o Parque
dos Patins. O nome foi inspirado no segundo parque mais antigo do mundo, Parque
Tivoli, em Copenhage, capital da Dinamarca. Inaugurado em 1843 por concessão do
Rei da Dinamarca Cristiano VIII para Georg Carstensen que convenceu o monarca
usando uma bela justificativa. “Quando as pessoas estão se divertindo, elas não
estão pensando em política”.
Tivoli Park na Dinamarca |
Mas voltando ao domingão, logo que
minha mãe estacionou o chevetinho SL 80 vermelho abri a porta e corri para fila
da bilheteria que estava gigantesca. Meu pai com meu irmão no colo só soltou um
“calma garoto”.
Assim que passamos o portão de
entrada vi que não era só a fila da bilheteria da entrada que era gigantesca,
mas cada brinquedo tinha uma fila que
dava volta no quarteirão. Com certeza quem estava disposto a ter minutos de
diversão tinha que penar por horas na fila.
Logo que entrei no parque o
brinquedo que me chamou a atenção não foi a famosa Montanha Russa Espacial, aquela
que dava um duplo salto mortal em piruetas. Me enjoa só de imaginar. Foi logo ali na entrada
mesmo, que meus olhos brilharam quando avistaram um brinquedo com varias
lanchas de cores diferentes que boiavam e giravam em circulo como um carrossel dentro de uma piscina
circular.
Comercial do Tivoli com ênfase na Montanha Russa Espacial (1983)
Então eu e minha mãe nos
posicionamos na fila e cada passo me imaginava pilotando minha lancha sobre as ondas
do oceano.
Foram mais ou menos 30 minutos na
fila de espera até que chegou a hora. Cada lancha comportava duas crianças,
então teria companhia na minha aventura. A lancha comportava duas crianças, mas não uma
“criançona”. Assim que me viu o operador do brinquedo fez um gesto com a mão
negando a minha entrada e falou:
- Não posso colocar você na lancha,
pois você é muito grande.
Minha mãe comprou logo a briga.
Sabe como é mãe, está sempre aposta para defender seu filho.
- Como assim! Meu filho vai sim entrar nessa
@$#@$@ (ela adorava um palavrão )
-Não pode senhora, olha o tamanho
do seu filho.
- Claro que pode, meu filho tem
treze anos e a placa do brinquedo limita a idade para quinze anos. Esbraveja ela
enquanto anda e gesticula em direção à placa de instrução do brinquedo.
Essa discussão já durava mais de 20
minutos com o brinquedo parado. Olho ao redor e o que vejo é aquela plateia e
alguns até dando pitaco: “- Deixa o gordinho brincar.” Eu queria abrir um
buraco na terra como avestruz e colocar minha cabeça dentro.
-Mãe, deixa pra lá. Não quero mais
ir no brinquedo.
- Haaaaaá, você vai sim! Agora a
briga é comigo. Quero falar com o diretor do parque.
Então um segurança que só
acompanhava o bate papo caloroso pediu que o acompanhássemos, pois nos levaria ao
diretor.
Ao entrarmos em uma ampla sala com
três mesas em cada canto, uma das mesas se destacava e lá um senhor sexagenário
com um pequeno topete dourado que não escondia os fios de cabelos brancos e uma
costeleta que se destacava nos atendeu. Com um sotaque italiano e uma voz calma
o senhor abriu o dialogo com a minha
mãe.
- Boa tarde, me chamo Orlando Orfei
e sou o responsável pelo parque. Em que posso ajudar?
Naquela época não sabia, mas
estávamos diante de um mito. Orlando Orfei nasceu em 8 de julho de 1920 na Itália,
Foi um dos maiores empresários circenses e adotou definitivamente o Brasil como
moradia no fim da década de 60 quando veio participar do Festival Mundial do
Circo no Maracanãzinho. Alem de
empresário, foi pintor, escritor, dublê e ator de cinema, mas sem dúvida o que
ele mais gostou foi ser domador de leões. Orfei recebeu várias condecorações e foi
recebido por 4 Papas. Faleceu aos 94 anos no primeiro dia do mês de agosto de
2015 no município de Duque de Caxias onde morava.
Orlando Orfei (08/07/1920 - 01/08/2015) |
- Olha só senhor Orfeu...
- É Orfei senhora. Cortou ele antes que a minha mãe prosseguisse.
E ali, fiquei sabendo que nem ela tinha ideia de quem era aquele homem.
- Olha aqui senhor Orfei, a gente
enfrente uma fila do @$@#@$ (acho que já falei que minha mãe adorava um
palavrão) e quando chega na hora do meu menino brincar ele é barrado pelo seu
funcionário! Isso é uma sacanagem. Balbucia minha mãe vermelha de raiva.
- Calma senhora, vamos resolver o
seu problema. Sente-se por favor. Quer um cafezinho? Foi passado agora mesmo.
Está ótimo. E com toda tranquilidade do mundo, Orfei começava a utilizar sua
técnica de domador, pois diante dele a minha mãe era mesmo uma leoa protegendo
a sua prole.
E continuou...
- Que garotão bonito que a senhora
tem. Quantos anos você tem garoto?
- 13. Respondi sem muitas palavras.
- A senhora já deve ter uma lista
grande de pretendentes a nora.
Orfei já ganhava a simpatia de
minha mãe. Qual é a mãe que não gosta de ter seu filho elogiado. Afinal, toda
mãe é coruja. Por mais feio que ele seja, pra ela é sempre um Kauã Reymond.
- Ele é lindo mesmo. Disse ela com
o rosto ainda vermelho, mas não mais de raiva.
- Olha só, vamos fazer o seguinte.
Seu filho vai poder sim andar no brinquedo, porem vamos coloca-lo sozinho sem a
companhia de outra criança e no meio para equilibrar o peso. Assim não terá
perigo de seu filho se molhar. Falou Orfei com o sorriso no rosto.
- Tá bom. Foram as únicas palavras
que minha mãe pronunciou.
-Vou pedir para o Sérgio, o nosso
segurança que trouxe vocês, acompanha-los até o brinquedo e passar para o
operador como proceder.
E assim foi feito, após nos
despedir do dono do parque fomos levados até o brinquedo e assim que o
segurança passou as ordens vinda do QG do parque pelo próprio general, minha
mãe não conseguiu conter aquela cara de ganhei a guerra. Mas, enquanto minha
mãe comemorava eu cumpria apenas a obrigação de sentar e ali ficar rodando sem
mais emoções. Torcendo para que fosse o mais breve possível. Não existia mais aquela fantasia de navegar pelo oceano. Era só
eu parado e sentado no meio daquela lanchinha verde que rodava, rodava, e
rodava.
- Acena pra mamãe. Insistia ela.
Ainda bem que naquela época não
existia telefone celular com câmera e muito menos Facebook, pois tenho certeza
que meu mico se eternizaria. Hoje escrevendo esse texto lembro-me daquele
momento como a recomendação do capitão dos Pinguins no filme de Madagascar.
Apenas sorria e acene. Mas sorrir era demais então apenas acenei.
Assim como no programa Domingo no
Parque do Silvio Santos, tudo na nossa vida é questão de escolha. É um SIM ou
um NÃO. Mesmo que não consigamos enxergar qual o prêmio que a vida nos reserva.
Então, se pudesse voltar no tempo enquanto fantasiava-me na cabine do foguete
do programa do Silvio eu teria gritado “–NÃO!” quando a luz vermelha acendeu
através do convite de minha mãe.
Oie:
ResponderExcluirAté tocante a história!
E vejo que és fã do tal parque...
Alias a década de 80 foi boa mesmo.
Tb sou do RJ (embora resida no RS há tempos).
E um pouco mais novo (tinha 10 nessa situação sua no tal parque).
Alias passava de veículo muitas vezes na frente.
Acho que nunca fui. Ou se fui no máximo 1 vez.
Isso de bullying sempre existiu; passei quando morava aí no RJ - onde só debatem a coisa mais recentemente.
Há muita coisa da cidade que pode ser mostarda (onde muita no lado ruim).
Se bem que a coisa aqui no sul não está diferente. Muita coisa mudou desde que vim para cá. Caso deseje informação, só pedir.
Sobre isso de PESO/eu era mais 'normal' quando menor. Depois ganhei um certo ao vir para cá. tento o máximo ter boa (ou NORMAL) saúde. Bom ver isto.
E que sua vida esteja boa na "nova" cidade.
Tchau,
Rodrigo
51 3779 9456